Divas e Monstros

Em julho de 2001 escrevi no www.art-bonobo.com , longa crítica sobre Vik Muniz. Contei como foi que Muniz foi parar nos Estados Unidos. O chamei de Mr. Thinker.
Destaquei suas conquistas nova-iorquinas e falei de sua exposição no Whitney. Ressaltei a importância dessa exposição em um museu que privilegia a jovem prata da casa.
Domingo 24 de abril, fui ao Centro Cultural do Banco do Brasil, da Álvares Penteado de São Paulo, para ver Divas e Monstros. Exposição de 12 fotos.
Muniz selecionou oito "Divas", Maria Callas, Grace Kelly, Sophia Loren, Brigitte Bardot, Liz Taylor, Catherine Deneuve, Romy Schneider e Mônica Vitti.
E quatro "Monstros", Frankenstein, Drácula, Múmia e o Fantasma da Ópera.
Não se discute o mérito da escolha. Pessoalmente nunca considerei Romy Schneider uma Diva e o Fantasma da Ópera um monstro.
Mas, como dizia minha avó, à chacun son goût, que em bom português corresponde a gosto não se discute.
Há quase quatro anos chamei a atenção dos internautas para o processo criativo de Muniz, para a utilização dos mais diversos suportes para a realização de suas fotos. Naquela ocasião me pareceu original e criativo.
Hoje não. A partir do momento em que os diamantes que serviram como suporte para as fotos das "Divas", 11 mil pedras num total de 550 quilates, no valor de 650 mil dólares e um quilo de caviar Beluga Imperial e Osetra Royal Malossol, ao custo de 17 mil dólares, que serviu de suporte para os "Monstros" assumiram significados que extrapolam seus limites, algo não bate.
Associar diamantes às "Divas", embora primário, tem certa lógica, mas caviar a monstros? Por quê não linguiça, jabuticaba, fios de ovos? Tão efêmeros quanto o caviar?
Em meu artigo de quatro anos atrás, disse que Muniz estava mais para Warhol do que para Duchamp e Man Ray. Ambos em 1920 incorporaram a poeira em La mariée mise en nu par sés celibataires, même.

Hoje direi que Muniz está mais para Salvador Dalí do que para Warhol. Dalí sem dúvida teria adorado os diamantes e o caviar. Dalí amava o luxo. Os milionários e poderosos. Lamentaria não ter pensado nos diamantes e caviar antes de Muniz.
Afinal as costeletas de porco, os ovos fritos, os feijões, as omeletes foram o mais longe que chegou. Lagostas e ouriços do mar o máximo da sofisticação. Diamantes e caviar seriam o supremo achado. A grande esnobação. O delírio total.
Chegou a ele sem a intenção de épater, de provocar, de chamar a atenção. EmEl Ojo del Tiempo, O Olho do Tempo, jóia-relógio na forma de um olho, Dalí usou ouro, rubi, diamante e esmeraldas. A peça está na The Owen Cheatham Foundation.
Que eu saiba ninguém nunca se preocupou em saber quantos diamantes, quantos quilates, quantos rubis, quantas esmeralda e quantas gramas de ouro tem o olho. Nem quanto vale. E muito menos atribuir a esses números e valores importância que não têm. Divulgar isso é típico de novo rico, deslumbrado.
Porém, é difícil esquecer aquele olho de Dalí que chora uma lágrima de diamante. Inesquecível!!! Aqui, o suporte é secundário. O que conta é a idéia.
Procuro lembrar de algo em Divas e Monstros. Não consigo. Só lembro dos números dos diamantes e do caviar.
Tudo indica que Muniz há muito não precisa disso. Não discuto a escolha do suporte. Porém o suporte ocupa cada vez mais espaço nas idéias, no pensamento de Muniz. A valorização do suporte passou a ser para Muniz um truísmo que se repete de proposta a proposta. Os pompiers do século 19 eram mestres nisso. Até que ponto isso é bom?
Acho que a resposta está nos comentários que ouvi de jovens que chegavam, olhavam as "Divas e os Monstros" e iam embora. Só falavam dos milhares de dólares dos diamantes e do caviar. Só!!!
O salário mínimo no Brasil é de R$260,00. Em dólares ao câmbio de hoje, R$2,53 US$102.76. Pouco não é? Salário de fome. Diamantes e Caviar....
Carlos von Schmidt
São Paulo, 27 de abril de 2005 22H43