Eros e Tanatos

 Rubens Gerchman  Kajurao Kamasutra 2007
Rubens Gerchman Kajurao Kamasutra 2007

 


E 2007 chegou ao fim. Hoje, domingo, 30 de dezembro, 13 horas e 8 minutos, acabei de ler o resumo do New York TimesLe Monde e Le Figaro

Li também artigos de Luciano Trigo. Sua lucidez, clareza, são exemplar. Gostei muito de O Poeta da Vida Moderna, sobre Baudelaire. 
Anos atrás, navegando no Atlântico Norte ao ver gaivotas e pássaros marinhos sobrevoando o Must, veleiro transatlântico, O Albatroz do poeta me vinha à mente. 

Em O PortoBaudelaire fala de au gréement compliqué, traduzido como mastros complicados. Ao pé da letra está correto, mas nos veleiros, se há algo que não pode ser complicado é o mastro. Muitas vezes nos portos, nas marinas, olhando os veleiros também observei os mastros. Velas ferradas, com o movimento das ondas se sobrepunham uns aos outros. Acho que a idéia é essa. Mastros sobrepostos. Emaranhados.

Baudelaire e mastros à parte, o assunto é outro. 
Um livro de arte: Eros e Tanatos Diário de Uma Viagem de R. Gerchman. Publicado pela J.J. Carol
A cada dia essa editora me surpreende mais. Depois dos livros sobre Tozzi, Granato, Gerchman e Baravelli, Eros e Tanatos é um livro que foge ao padrão habitual. 

Primeiro. Não é um desses livros encomendados por artista a crítico de arte. Desses produzidos em série. Segundo. Não é do tipo coffee table book. Livros que ficam em mesas de café, vistosos, grandes e vazios.

Rubens Gerchman  Circus (detalhe) 2007
Rubens Gerchman Circus (detalhe) 2007


Eros e Tanatos não se enquadra nessas categorias. É um livro de autor. A criação e o design são de Rubens Gerchman. E daí, dirá o leitor. Não é o primeiro nem será o último livro “bolado” por um artista plástico. Claro que não. 

A diferença é que nem todos artistas plásticos tem o know-how, a experiência gráfica que Gerchman tem. Seu livro, de capa a capa revela o designer que sabe o que faz.
A escolha do formato do livro, 22 por 18 centímetros, o papel, canson, a impressão, tudo justifica a paráfrase de Wilson Coutinho de que “A Crise da imagem exige que o artista seja um voraz catador de seixos num rio seco.” 

Acrescento que não basta catar seixos. É preciso saber selecioná-los. E isso Gerchman sabe fazer muito bem. Do origami inicial ao auto-retrato da terceira capa, as imagens fluem. Como a água sobre os seixos. 

Do primeiro auto-retrato da contra-capa ao último da terceira capa, Gerchman “brinca” com sua imagem. 
Interfere sempre, rabiscando, desenhando, pintando, sobrepondo colagens. Em nenhum momento dá chance ao narcisismo. Seus auto-retratos são a negação dos auto-retratos.

 Rubens Gerchman  Auto Retrato 2007
Rubens Gerchman Auto Retrato 2007


Mas, Eros e Tanatos não se limita aos auto-retratos. É um diário de uma viagem. Ou melhor, de duas que Gerchman fez à Índia. Em 2001 e 2002. 
De tudo que vi e li, direi que as fotos do Kajurao, chamados por muitos, Templo do Amor, nome contestado por inúmeros outros, me interessaram. Muito.
Não é de hoje que essas figuras eróticas me fazem pensar no oriente. Em sexo. 

Nelas, homens e mulheres, e não deuses como muitos supõem, fazem sexo assumindo as posições estabelecidas pelo Kamasutra. Gerchman as fotografou.
As ampliações dessas fotos permaneceram engavetadas até 2007. A partir delas, sobre papel de gravura e de desenho, Gerchman as trabalhou com lápis de cor e pastel seco. 

O resultado é no mínimo provocante. Depois da intervenção de Gerchman, as imagens do friso do Kajurao, para mim, não são mais o que eram. Gerchman, como bom catador de seixos, renovou-as. Transformou-as. Arte é isso. 

São Paulo 30 de dezembro de 2007 16:04
Posted by Carlos von Schmidt