O vândalo do urinol

 Urinol de Marchel Duchamp Dada Beaubourg
Urinol de Marchel Duchamp Dada Beaubourg

 

Em 7 de janeiro de 2006, publiquei na seção Curtas & Rápidas pequeno artigo, Urinou e martelou. Falei de um velhinho de 77 anos que em 1993 em uma exposição de Nimes, França urinou no antológico Fountain, Fonte , de Duchamp. 

Depois de urinar, martelou a Fonte. Ficou preso um mês. Teve de pagar o restauro, 16.336,80 francos, mais multa. 

Não satisfeito com o feito, treze anos depois, em 4 de janeiro de 2006, na exposição Dada, do Centro George Pompidou , Beaubourg, de Paris, de novo atacou a Fonte.

Só que dessa vez não urinou. Martelou-a. Na época nenhuma notícia sobre o vandalismo trouxe o nome do autor.

Artigo extenso publicado no Le Monde de ontem, identifica-o. É o “artista” Pierre Pinoncelli. Pintor. Mal sucedido. 

Useiro e vezeiro em ações desse tipo. Desde 1963 vem aprontando. Orgulha-se de ter realizado 70. Uma delas foi ter jogado tinta vermelha, a cor dos comunistas, no Ministro da Cultura , André Mallraux, na inauguração do Musée Chagall de Nice, em 1969. 
Deu à agressão o nome de “attentat culturel contre Mallraux”, “atentado cultural contra Mallraux”. No governo de De Gaulle, Mallraux que sempre esteve à esquerda comportou-se como reacionário de direita. A ação de Pinoncelli foi totalmente inconseqüente.

Oportunista, em 2002 em um museu de Cali, Colômbia, em um festival de performances deu um show completo. Cortou a falangeta do dedinho da mão esquerda. Com sangue escreveu na parede branca, FARC, sigla das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, guerrilha poderosa, temida. 

Toda a ação foi televisionada. Na ocasião declarou que sua intenção foi compartilhar da violência colombiana. Através de um gesto violento em prol da libertação de Ingrid Betancourt, em poder das FARC. Solidariedade. Só! 
As FARC ignoraram o happening, Ingrid Betancourt continua seqüestrada até hoje. 

Exibicionista, sempre faz declarações aos jornais. Às televisões. Desfruta com gosto dos 15 minutos de fama.

Antes de ontem, 9 de fevereiro, Pinoncelli voltou a ser notícia. Só que dessa vez o alvo foi ele. A ação não foi “artística”, foi judicial. O Centro Pompidou, Musée National d’art moderne o processou. Foi condenado a três meses de prisão em liberdade e dois anos em liberdade condicional e a pagar 14.352 euros pela restauração da obra. Apelação é certa. 

O valor pedido pelo Centro Pompidou era de 427.000 euros, pois estima a Fonte em 2,8 milhões de euros.

Pierre Pinoncelli
Pierre Pinoncelli
 

Na batalha judicial o advogado de Pinnoncelli declarou em alto e bom som que a Fonte não é arte. Não passa de urinol que se pode comprar em qualquer casa que trabalhe com objetos para construção. Contestou também a posse da Fonte. Negou que o Pompidou é o dono. 

É incrível que fevereiro de 2007 ainda se discuta isso. Ainda mais em um tribunal. E que um vândalo contumaz tenha a desfaçatez de dizer “agora não sei o que vou fazer. Gostaria, em último caso, de voltar à pintura” . 
Que não é grande coisa, pois nunca se falou dela. 

São Paulo, 11 2 07 13:17 posted by Carlos von Schmidt 

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